O Mapa da Violência 2014 é aterrador. Com dados de 2012, fornecidos pelo Sistema de Informações de Mortalidade, do Ministério da Saúde, revela que o Brasil, naquele ano, registrou índice de homicídios quase seis vezes superior à taxa considerada epidêmica pela Organização Mundial da Saúde. Foram 58,1 assassinatos a cada grupo de 100 mil habitantes, contra os 10 por 100 mil estabelecidos pela OMS, proporção, de resto, superada por todas as capitais brasileiras.
E quanto mais se aprofundar na análise do estudo, maior o estarrecimento. Por exemplo: mata-se cada vez mais negros do que brancos. Das 56.337 pessoas assassinadas, 41.127 eram pretas ou pardas e 14.928 brancas. Mais: em relação a 2002, diminuiu o número de brancos mortos, que somaram 19.846 naquele ano, enquanto as vítimas negras, muito pelo contrário, se multiplicaram, passando de 29.656 para 41.127 no período. A questão é registrada como “crescente seletividade social”, mas bem poderia ser denominada genocídio.
Também não seria tão desproposital falar em guerra civil no trato da dimensão das mortes. Embora esse conceito não se aplique ao caso, qual parâmetro de comparação usar diante de realidade tão obscena quanto a perda da vida, por assassinato, ao longo de 2012, de mais 30 mil jovens com idade entre 19 e 26 anos? Pois eles representaram 53,4% do total de homicídios no país, sendo que a quase totalidade, 91,6%, era do sexo masculino.
A cada Mapa da Violência divulgado no Brasil, o que ocorre anualmente, aumenta o debate sobre as causas, as consequências e as políticas públicas necessárias para reverter o quadro. Isso, por si, já é positivo. Também há avanços, por incrível que pareça, ainda que o país ocupe o sétimo lugar num ranking de 100, atrás de El Salvador, Guatemala, Trinidad e Tobago, Colômbia, Venezuela e Guadalupe. No Sudeste, por exemplo, São Paulo e Rio de Janeiro conseguiram reduzir as estatísticas, mas Minas fugiu à regra, com os homicídios crescendo 52,3% entre 2002 e 2012.
No Norte, os assassinatos mais do que dobraram (de 2.937 para 6.098). No Sul, aumentaram 41,2%; no Centro-Oeste, 49,8%. No Nordeste, todas as capitais tiveram mais de 100 homicídios por 100 mil jovens. Destaque para Maceió, cuja taxa passou de 200. Destaque também para os estados do Maranhão, da Bahia e do Rio Grande do Norte, que mais do que triplicaram esse tipo de morte.
Até o próximo relatório, esses números passarão por muita análise. Diagnósticos serão elaborados, promessas renovadas. Mas a pergunta que não quer calar é: até quando vai imperar a impunidade? Afinal, quando a polícia estiver pronta para investigar e deter os assassinos; a Justiça, a mandá-los rapidamente para detrás das grades; e o sistema penitenciário conseguir fazê-los cumprir as penas e recuperá-los, aí, sim, essa realidade começará a mudar para valer. Por ora, o que se sabe, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça, é que menos de 11% dos homicídios dolosos recebidos pelos tribunais estaduais até 2009 foram julgados, havendo mais de 58 mil processos à espera de decisão.
Jornal Correio Braziliense
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