Há algumas semanas estamos ruminando a estória veiculada na mídia sobre o “Estupro ocorrido no “BBB”, programa da TV Globo, que tem como ponto de partida confinar pessoas numa casa de luxo, expondo suas intimidades de modo que o público decida quem será o vencedor. Nas últimas semanas dentro da casa ocorreu algo com dois dos participantes que sugeriu ao público uma violação de direitos: um rapaz teria mantido relações sexuais com uma das participantes enquanto esta estava inconsciente.
O caso ocorrido no “BBB” aponta para indícios de um possível abuso sexual contra uma mulher participante, que deve ser julgado como qualquer outro caso ocorrido na sociedade brasileira, da maneira mais justa possível. Mas o que vimos foi uma chuva de absurdos; além de não impedir a violência no momento em que ela poderia estar ocorrendo, os responsáveis pela emissora tentaram escamotear o fato; depois tentaram tirar de circulação as imagens e finalmente assumiram o ocorrido sem nomeá-lo. Nas edições seguintes do programa, após todas as denúncias que aconteciam pela internet, o canal transformou a suspeita de um crime em uma cena "de amor". O espírito da coisa foi resumido pelo próprio apresentador Pedro Bial: “o espetáculo tem que continuar”.
Sem fazer juízo de valor sobre a qualidade do programa ou sobre o comportamento dos participantes, o que queremos propor, após alguns dias com essa estória no pensamento, é uma reflexão sobre a condição da mulher. Mais, especificamente, uma reflexão sobre a imagem da mulher difundida pela mídia que chega à sala de estar das nossas casas.
O que observamos, fazendo parte do movimento feminista há alguns anos e acompanhando casos cuja matéria é a mesma, é que não raro as mulheres passam de vítimas, para culpadas da violência que sofreram. Sabemos dos índices elevados de violência sexual, sabemos também que os causadores da violência física e sexual, em maior grau, são pessoas próximas à mulher. E que como no caso da violência física, a mulher é sempre colocada em dúvida e agredida com os seguintes jargões: “NINGUÉM MANDOU USAR SAIA CURTA”; “ELA FOI ESTUPRADA PORQUE PROVOCOU, SABE COMO É HOMEM”; “APANHA PORQUE GOSTA”; “NINGUÉM MANDOU BEBER, MULHER SÉRIA NÃO FICA BÊBADA POR AÍ”, um verdadeiro “estrupo moral” que gera preconceitos e não permite que as mulheres sejam tratadas com a eqüidade necessária para fazer valer a justiça nesses casos.
Isso para não falar de muitas que ao serem violadas sexualmente, ainda há pouco tempo, tinham que casar-se com o algoz para “limpar sua honra”. Não foi à toa que o “amor” entrou na discussão no “BBB”, como se o envolvimento afetivo nos livrasse a todos de encarar a realidade da violência cometida.
Então o caso do “BBB”, a despeito, de quem é a culpa e de qual solução será dada ao assunto, reavivou no pensamento coletivo um ponto que é comum a todas nós, a violência cometida pela sociedade e pelo Estado em relação ao corpo feminino. E esta violência silenciosa está presente em detalhes, como quando a mulher não pode decidir sobre seu próprio corpo sendo isso transferido às instituições patriarcais e retrógadas, que desejam nos moldar a sua imagem e semelhança; como por exemplo, nos escravizando à ditadura da beleza; as leis que controlam o aborto; as determinações sobre a sexualidade e tudo aquilo que aprisiona a mulher dentro do que é certo fazer sendo mulher, mesmo que ser mulher seja uma construção histórica e social.
Portanto, casos como esses nos convidam a refletir sobre o quanto o corpo da mulher é violado física e moralmente na nossa sociedade, pois, realçam em nós o aprendizado sobre o que é ser mulher, nos propondo melhorá-lo.
HELENA RIBEIRO DA SILVA
Presidenta do SEAAC de Americana e Região
Diretoria de Assuntos da Mulher FEAAC
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